Livro de Affonso Romano que está sendo relançado neste ano. Como já publicado em outro post aqui no blog, Affonso Romano estará presente na nossa 24ª Edição da Feira do Livro de Gravataí. Relembrando que será do dia 14 ao dia 20 de outubro.
Retirei do blog que há sobre o livro, que é este ttp://quepaiseesteolivro.wordpress.com/, o texto abaixo explicativo sobre a obra:
"Em plena ditadura militar, Affonso Romano de Sant'Anna lança Que País é Este?, uma coletânea de poemas que dão um panorama crítico da sociedade brasilera de então. O poema que dá título ao livro foi publicado com destaque no Jornal do Brasil na data de seu lançamento e, tamanha sua repercussão, foi traduzido para o espanhol, inglês, francês e alemão, transformado em “posters” e colocado em escritórios, sindicatos, universidades e bares. Trinta anos depois da publicação, a Editora Rocco reedita a obra de Sant'Anna, uma leitura obrigatória e atual para entender melhor o Brasil."
No blog é possível assistir ao vídeo sobre a entrevista de Affonso no Jô. Verifiquei no youtube, mas por questões de direitos autorais não está disponível.
Abaixo está um dos poemas do livro:
CRÔNICA POLICIAL
1
Ontem três homens duros e armados
entraram na casa de um casal amigo
comeram, beberam, violentaram uma visita,
levaram dinheiro, objetos e saíram em zombaria
— num carro que largaram no subúrbio da Central.
Ontem a filha de um amigo esperava o ônibus,
chegou-lhe um mulato forte, que lhe deu um bote,
levou-lhe a bolsa e o corpo para o matagal
surrando-a com pedra e pau. E ela morria,
não conseguisse correr e se lançar na frente de um carro
que obrigado a parar levou-a ao hospital.
2
O casal da primeira estrofe e estupro
não foi ao jornal, mas hoje recebeu
outro casal
seviciado pelo mesmo grupo
que possuiu a mulher grávida
e seqüestrou a empregada como trunfo.
O pai da filha com o rosto destruído
ocultou a notícia com medo
da chantagem e da polícia.
3
Da minha varanda outrora eu via o mar e a ilha
antes de erguerem armadilhas e arranha-céus
em nossos bolsos e vistas. Crimes, antigamente,
não eram organizada guerrilha. Eram desastres aéreos
que não ocorriam com a gente.
Hoje sucedem-me na sala
— entre um programa e outro
no quarteirão
— entre um legume e outro.
Estou no Líbano, na Irlanda, Vietnã, Chicago e Stalingrado.
Há uma batalha em plena rua e o governo não sabe.
Inaugura estradas, deita fala, sem ver que as rodovias
estão cheias de eleitores mortos
— e seu discurso, crivado de balas.
4
Há dias,
minha filha vindo do colégio
deu o relógio
a um garoto uniformizado,
mas armado de pau e prego,
como a prima, que entregou o colar na esquina.
À filha menor ainda não assaltaram. Assaltaram-lhe
a primeira babá na praça. Assaltaram-lhe
a segunda babá na praia
entre ameaças
ao prevenir à turista
para manter sua bolsa à vista.
E da janela onde outrora eu via o mar e a ilha,
mal vejo o meu futuro e os banhistas. Vejo dois homens
correndo escuros da praça para boca da favela,
jogando para o ar uma bolsa amarela.
— É o quinto assalto hoje nessa esquina,
dizem no bar, enquanto entre o capacete e o cassetete
passam tranqüilos
os dois policiais peripatéticos do dia.
5
Minha porta já tem 100 trincos.
Depois de 6 revólveres, comprarei 5 bazucas,
8 granadas,
12 miras telescópicas,
embora nada me garanta que não me ponham a porta abaixo
com seus tanques.
Fora isto, não sei ainda o que fazer.
Mas não vou ficar aqui como um personagem de Hemingway,
que cansado de fugir
se deita velho como um cão
aguardando que me trucidem
a mim, minha família,
e mandem a foto autografada ao Presidente
como sinal da mais alta estima e elevada consideração.
Fica o registro de que o estrato visual não está idêntico à formatação do livro, pelo fato do blog não aceitar certos ajustes gráficos de parágrafos.
Tenho certeza de que este livro será um sucesso, pois retrata a real situação do país. Embora passados 30 anos, a crise continua, e ainda há muito a ser feito. Não tem como uma leitura destas nos passar despercebida, sem que nos enquadremos em algumas destas situações.
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