sábado, 19 de junho de 2010

E ontem foi um dia de luto


Vai-se Saramago ao outro lado da vida, a morte vem buscá-lo. E o desejo da gente é de que ele não morresse, mas Saramago já estava com 87 anos e vinha sofrendo de várias doenças... E mesmo assim, o desejo da gente vai ser sempre de não querer que as pessoas morram. Mas e se ninguém mais morresse? E se fosse possível realizar esse desejo intrínseco no ser humano? Pois Saramago escreve essa história, a história de um país fictício em que a morte, por querer castigar aos homens e fazer com que eles percebam o seu real valor, decide parar com seus trabalhos: No dia seguinte ninguém morreu. Mas não foi só no dia seguinte, isso seguiu por oito meses. Intermitências da morte é o nome desta obra maravilhosa.
Geralmente escrevo aqui no blog sobre o último livro que li e gostei. Obviamente ia escrever sobre este também, mas com a morte de Saramago juntamente com outra grande coincidência que ocorreu nesse 18 de junho, este texto é diferente dos outros.
A grande coincidência foi que eu e um grupo de colegas da faculdade ficamos responsáveis pela apresentação deste livro para a turma. Essas datas de apresentação são marcadas com meses de antecedência. E justo, foi cair no mesmo dia de falecimento do nosso queridíssimo Saramago. Uma super ironia!
E ironia é o que não falta nas suas obras, aliás, é uma constante nesta, em especial. Saramago retrata um sistema social de forma muito cômica. Faz verdadeira piada sobre a igreja, a polícia, a máphia (que sempre surge aproveitando-se das necessidades sociais), as funerárias (que passam a viver do enterro de cachorros, gatos e pássaros) e também sobre a televisão, a mídia.
É tão piadista sua crítica, que a impressão que dá é a de estarmos lendo algo que acontece só na ficção, que só pode ser história inventada. E na verdade não é. Ele fala é do sistema em que vivemos, que parece tão ridículo...
Lembro do dia em que peguei o livro na faculdade e voltei no ônibus lendo. Incrível a intensidade que foi, quando vi já estava em casa. O Saramago escreve o que tem que escrever e explica, sem ser, de maneira nenhuma, redundante. É como se a explicação fosse imprescindível, mesmo já tendo entendido o que ele quisera dizer. O que pode ter me dado a sensação de intensidade são os períodos longos e a sua pontuação um tanto caótica. Mas, veja bem, caótica aqui foi utilizado, simplesmente porque ele não a usa de forma convencional, mas como ele acha que deve usar. Por exemplo, nos diálogos, é perceptível quando é um interlocutor ou outro porque ele os diferencia com letra maiúscula. Não tem nada de travessão, tudo vírgula. E ponto final é raro, mas tem!
Mas quem sabe sintaxe, sabe ler Saramago, e vice-versa.
É, o tema da morte está sempre vivo! (el paradoxo) E assim o está mais uma vez nesta obra de Saramago, inclusive humanizando-se, pois a morte apaixona-se pela vida.
Posso terminar o texto dizendo, ainda bem que morremos. Mesmo que não nos acostumemos, isso é o natural e, antes disso, necessário!


Thais Deamici

Um comentário:

  1. Dizem que coincidências não existem. São as forças do destino. Achei muito interessante essa forma de enxergar a morte como necessária. Óbvio que todos nós temos medo de morrer, ou perder pessoas queridas, mas a forma como cada um vê faz com que a aceitação se torne mais fácil ou difícil. E esse texto é bastante esclarecedor e faz com que encaremos isso tudo de maneira bem mais simples.

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